Algum
tempo atrás transitar de manhãzinha por Santiago era um show de imagens. Quando
falo em show de imagens me refiro às crianças
indo para as escolas. Uns a pé outros de bicicleta, mas o que chamava a atenção
era como, a forma que isso acontecia. Ir à escola enquanto andavam era uma brincadeira só. Corriam, gritavam, um derrubava os livros e cadernos dos outros, os
menininhos azucrinando as meninas...Mas e hoje onde andam nossas crianças que
não as vemos mais? Os números de alunos esta diminuindo, a escolas encolhendo? Até que ponto se mede
a qualidade de vida de uma cidade? Da mesma forma que se mede a qualidade de
vida das pessoas que moram? Cada dia vejo mais crianças sendo levadas ou de carro pelos familiares ou de Transporte Escolar.
Lendo este artigo me deparei com a pergunta:
Quer
saber se uma cidade é boa ou ruim? É simples: olhe para fora da janela e tente
calcular a proporção de crianças entre as pessoas que estão na rua. A cada 100
pessoas que passam, quantas são crianças caminhando para a escola, pedalando
pela rua, brincando na calçada? Se forem muitas, sua cidade está saudável. Se
forem poucas, sua cidade está doente. Se não houver nenhuma, a doença é grave:
sua cidade precisa de uma intervenção urgente. Seu prefeito está trabalhando
errado.
O simples fato disso acontecer, já traz informação
sobre saúde, segurança e educação, três itens centrais para definir qualidade
de vida.
Pelo
seguinte:
Saúde – Caminhar ou andar de bicicleta por
meia hora ao dia é o suficiente para uma criança afastar muito o risco de
sofrer das típicas doenças de estilo de vida que estão afetando tanta gente nas
grandes cidades: diabetes, câncer, doenças do coração. Criar condições para que
todas as crianças façam exercício na ida-e-volta da escola é uma forma
infalível de garantir uma população saudável e economizar uma fortuna de
dinheiro público em hospitais.
Segurança – Está bem estabelecida a relação
estatística entre o número de crianças e mulheres pedalando e a segurança no
trânsito. Crianças de bicicleta são um indicador preciso: se há muitas delas na
rua, praticamente não ocorrem acidentes, em parte porque seres humanos são
geneticamente programados para tomar cuidado quando há pirralhos por
perto. Além disso, crianças aumentam muito a quantidade de “olhos da rua”,
que são as pessoas que ficam na entrada de casa olhando para o movimento da
calçada, e que fazem com que o índice de crimes naquele lugar caia imensamente
(um conceito criado pela grande urbanista americana Jane Jacobs). Ruas com
muita vida comunitária tendem a ter muitos “olhos”, e portanto são bem mais
seguras. Crianças ajudam muito a fazer com que haja vida comunitária.
Educação – Uma pesquisa divulgada este ano com
20.000 estudantes dinamarqueses entre 5 e 19 anos demonstrou que crianças que
vão para a escola a pé ou de bicicleta têm uma capacidade bem maior de se
concentrar na aula, e aprendem mais do que aqueles que vão de carro. A pesquisa
revelou que, quatro horas depois do começo da aula, os alunos que pedalaram ou
caminharam continuam mais atentos e aprendendo mais do que os
outros. Outra pesquisa reveladora foi feita na Califórnia, em 1993. Os
cientistas pediram a crianças que vão para a escola a pé, de bicicleta ou de
carro para que elas desenhassem o bairro, e depois as entrevistaram. A conclusão
foi que crianças que caminham ou pedalam tem habilidades cognitivas muito
maiores: elas têm mais noção de espaço e desenvolvem mais suas capacidades
sociais.
Enfim,
para resumir: cidades onde não há crianças nas ruas têm índices maiores de
obesidade infantil e gastam mais combatendo diabetes, câncer e doenças do
coração, são mais violentas no trânsito e têm maior criminalidade, atrapalham o
rendimento escolar das crianças, reduzem a eficácia da educação, prejudicam as
capacidades cognitivas e sociais das crianças. Só isso.
E,
ainda assim, muitas cidades brasileiras medem a qualidade de suas vias
simplesmente contando quantos veículos passam por determinada rua em uma hora.
Quanto mais veículos, maior a “eficácia da via”. Ou seja: para os
administradores urbanos das principais cidades brasileiras, cidade boa é aquela
onde as filas de carro não param jamais de passar, espalhando fumaça tóxica
pelo espaço urbano e expulsando as crianças.
É
um critério ruim, e isso ajuda a entender por que nossas cidades estão tão
ruins – como a blogueira Natália Garcia, do Cidades para Pessoas, costuma dizer, uma
cidade que define as metas erradas não tem nenhuma chance de chegar ao lugar
certo.
Deveríamos
exigir dos nossos prefeitos que eles adotem esta nova meta: que contem a
proporção de crianças no espaço público e que governem todos os dias com um
objetivo central: aumentar essa proporção. Simples assim.
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Este
texto foi publicado originalmente na Gangorra Mag, uma revista publicada pelo
ColetivoGangorra para comemorar o Dia Mundial Sem Carro
de 2013.