sexta-feira, 5 de dezembro de 2014

É preciso Morrer para Ser Bom?

Grande aglomeração se formava á minha volta enquanto que eu parecia jazer inerte sobre fria mesa em cuja cabeceira se encontrava estrategicamente, reluzentes castiçais com suas velas acesas a enfumaçar-me ás narinas desprotegidas de um salvador chumaço de algodão embebido no perfume dos éteres da vida pelos que por aqui ainda ficaram.

Observava, sem poder me manifestar, que ao meu lado direito, de pé, se achava a esposa querida juntamente com os filhos devotados, com os rostos em prantos convulsivos apesar de serem detentores da recomendação que lhes deixei em vida de que se esforçassem o máximo para não chorar a minha perda. Que ao contrário de chorar que sorrissem por que na verdade eu não estaria morrendo, mas renascendo noutra vida, onde com toda certeza eu lhes esperaria para seguirmos sendo felizes assim como o fomos aqui na terra.

Pessoas as quais eu antes jamais havia visto mais gordas ou magras estavam ali, postadas, amparando os familiares e chorando em meu velório.
Inerte. Curioso, pois eu queria saber do que havia morrido e de certa forma incomodado com aquelas presenças ative-me no diálogo que em instantes entabularam.


Em um cantinho duas moçoilas bonitas se aproximaram do ataúde. Assim se expressaram:
- Hehém, morreu “tão feliz” que ainda mantém o sorriso nos lábios...

Grande alegria e entusiasmo se apossaram do meu ser. Para um defunto recém-desencarnado até que o meu ego estava bastante aguçadinho. E eu que pensava que quando se morre, o ego fica por aqui. Não observaram que a boca ligeiramente torta foi pela falta de um pontinho do costureiro que na pressa me liberou de qualquer jeito.
- Como ele era bonito... Meu Deus, quantas vezes a gente deve ter se cruzado por ai e jamais nos olhamos... Nunca nos cumprimentamos. Parecia ser uma pessoa muito boa... Experiente... Com muitas coisas a ensinar.

Antes mesmo que a minha vaidade se aflorasse e algum outro desejo se apossasse de mim, providencialmente, ex-colegas da empresa onde trabalhava se manifestaram contrariamente, esbravejando com as dondocas no sentido de lhes dizer que eu jamais fui tudo aquilo que elas diziam.

Que por certo estavam se referindo a outro defunto. Asperamente lhes interrompeu:

- Engano seus, suas tontas... Esse tal de Enoque era a pessoa mais esnobe que já conhecemos. Antipático até a medula. Não falava com quase ninguém. Nada via á sua frente senão apenas o trabalho que, para desenvolvê-lo, pisava em todo mundo. Verdade seja dita, ninguém pode se transformar em santo só por que morreu. Temos de respeita-lo somente pelo grande profissional que foi. Sujeito integro, honesto, decente e respeitador, mas, convenhamos, nenhum outro mérito de bondade podemos lhe atribuir em trinta anos de convívio. Frio. Rústico. De poucas palavras. Pouco sorria, apesar de retribuir sempre quando lhe sorriam... Não vemos nada que justifique tamanha reverência por parte de vocês. Não se iludam.

Confesso que aquele grupinho de ex-colegas “amigos da onça” me deixou deveras frustrado. Concordo que nunca fui um modelo de bondade, mas daí a me chamar de antipático. Esnobe já era demais. É certo que no ambiente corporativo até por força das atribuições que eu desenvolvia pouco falava, pois estava sempre concentrado na lide. Mas jamais pensei que aquele meu gesto fosse capaz de causar descontentamentos aos meus ex-colegas.
Á verdade é que eu sempre gostei de todos e pouco me importei em pensar se todos gostavam de mim.
- Pouco o via... – Se muito falei com ele umas duas vezes, balbuciou uma vizinha residente em frente a minha casa.
- Era do bem, disse outra. – nunca o vi em farras. Não bebia. Não fumava e vivia feliz e harmoniosamente entre a família e o trabalho. Era muito educado e a todos cumprimentava com um leve sorriso nos lábios, mas realmente não era de parar para conversar com vizinhos.
Ponto pra mim.

Mesmo estando ali, “cara a cara” com toda aquela gente, não obstante se referirem a mim eu não tinha como esboçar qualquer reação para ao menos dizer que sempre procurei ser um bom sujeito em vida, que amei a todos indistintamente, que jamais tive qualquer desavença com alguém, mas que eu não me preocupava em saber se alguém gostava ou não de mim ou do meu jeito de ser até por que quando saia de minha casa para ir ao trabalho não o fazia para agradar a ninguém, mas para dedicar-me a empresa a qual me remunerava pela minha capacidade produtiva e resultados inequívocos.

Será que eu fiz realmente a coisa certa? E se eu pudesse retornar à vida faria tudo do mesmo jeito? Se me fosse permitido reescrever o meu passado utilizaria das mesmas tintas e letras?
É evidente que não.
Procuraria, desta vez, ser mais cordial, participativo, amável para com todos e dedicado aos menos favorecidos. Abriria um largo sorriso para cada amanhecer, a cada pessoa que encontrasse pela frente e nunca mais negaria um simples cumprimento a alguém por desconhecido que fosse. Seguiria, evidentemente, sendo responsável no trabalho mais em momento algum o privilegiaria em detrimento do convívio com a família. Daria, por certo, total atenção a minha querida mãezinha que durante toda a vida a privei de minha presença pelo sacrifício imposto pela lei da sobrevivência. Resumindo: eu faria tudo ao contrário. Solveria, lentamente, cada respiração. Observaria, nítida e atentamente, o canto dos pássaros, ás flores, o burburinho das ruas, os esmoleres nas calçadas e até mesmo os obstáculos e dificuldades que a vida colocasse em meu caminho os quais eu procuraria superar sem reclamar, mais com toda alegria e entusiasmo por saber que fazem parte da existência terrena e que Deus prova-nos a cada momento em nosso próprio benefício nos preparando para uma vida melhor em outros mundos.

Que pena que eu não soube aproveitar aquela encarnação e agora estou aqui no veneno amargando reminiscências que acabam de ficar para trás. Quem sabe na próxima encarnação eu retornarei com estes misteres em mente para poder pratica-los e no fim da mesma partir sem quaisquer arrependimentos?
Pois é!

Não espere morrer para ser bom. Pratique o amor e a bondade em todos os dias de sua vida e seja feliz.
E tenho dito!
Em tempo: ainda não morri. Estou vivinho da Silva. Feliz por saber que nem de longe fui ou sou o que os colegas “falaram no meu velório” mas se tivesse sido, tempo teria aqui para me corrigir.

        Enoque Alves Rodrigues


Fonte: http://www.forumespirita.net/

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