Cartas
pessoais que ficaram guardadas a pedido de Madre Teresa tiveram seu conteúdo
revelado recentemente, revelando aos adeptos e admiradores da Madre um lado
bastante humano, apesar da imagem superior que ela transmite a todo o mundo.
Nessas
cartas, Madre Teresa relata seu estado íntimo quando o assunto é sua relação
com Deus.
Em
uma de suas cartas, ela afirma, dirigindo-se ao reverendo Michael Van Der Peet:
“Jesus
tem um amor muito especial por você. Enquanto que para mim, o silêncio e o
vazio é tão grande que eu olho e não vejo, escuto e não ouço, a língua se move
[em oração] mas não fala... Eu quero que você reze por mim”.
Em
outra carta, ela pergunta: “Dizei-me, Pai, porque há tanta dor e escuridão em
minh’alma?”
As
cartas estão publicadas no livro “Madre Teresa, venha ser a minha luz” (em
tradução livre), organizado pelo padre canadense Brian Kolodiejchuk,
responsável pelo processo de canonização da Madre. O padre Brian lamentou que a
revista Time houvera dado uma conotação de crise de fé para o que ele chama de
prova de fé.
Antes
de prosseguir e tirar nossas conclusões, que podem não coincidir com a
realidade, é interessante lembrar a trajetória da Madre, e observar suas obras,
antes de falar de sua fé.
Madre
Teresa de Calcutá nasceu no dia 27 de agosto de 1910, na Albânia. Seu nome
verdadeiro é Agnes Gonxha Bojaxhiu. Aos 18 anos iniciou sua vida religiosa na
Irlanda. Alguns meses depois, expondo o desejo de se dedicar à beneficência na
Índia, teve sua viagem autorizada. Então escolheu o nome de Teresa, como
homenagem e inspiração de Terezinha de Lisieux.
Em
1946, aos 36 anos, durante uma viagem de trem, em contato próximo com a miséria
da Índia, a Madre parte para seu retiro com a imagem dos famintos e miseráveis,
e a partir daí inicia a tarefa que sempre desejou fazer: diminuir as
necessidades sociais e espirituais dos indianos.
Em
1948 recebe a autorização para deixar as quatro paredes do Colégio de Santa
Maria e viver com os pobres de Calcutá. Nos anos seguintes, com a adesão
voluntária e admirável de ex-alunas da Madre, o mundo irá observar a chamada
Congregação das Missionárias da Caridade expandir-se por muitas cidades da
Índia, e logo após para vários países do mundo.
Seu
exemplo arrasta – os exemplos sempre arrastam, nos diz Francisco de Assis – as
opiniões de todo o mundo, o que a levou a ganhar o prêmio Nobre da Paz em 1979,
aos 69 anos.
Em
meio a todo esse trabalho de alcance social e espiritual inimagináveis, segundo
suas cartas, ela sentiu-se sozinha, e duvidou de si mesma. Mais do que duvidar
de Deus ou de Sua ajuda, ela sentiu insegurança com respeito a si mesma.
O
trabalho, entretanto, seguiu inalterado.
Muitas
outras personagens do Cristianismo e do Espiritismo mostram, em suas
trajetórias iluminadas, momentos de dúvida.
Paulo
de Tarso, em seu belíssimo sonho com Abigail e Jeziel, expõe, em silêncio, o
que se passava em seu mundo íntimo. Abigail então pergunta: “Que é isso?
Choras? Estarias desalentado quando a tarefa apenas começa?”
Eurípedes
Barsanulfo, depois de conhecer a Doutrina Espírita, talvez hesitante quanto ao
que fazer diante da percepção de horizontes tão mais amplos, recebe a ordem
clara e precisa do espírito Vicente de Paulo: “Abandone, sem pesar e sem mágoa
o seu cargo na congregação. Convido-o a criar outra instituição, cuja base será
Cristo e cujo diretor espiritual serei eu e você o comandante material”.
Allan
Kardec deixou claro, em seus escritos, o quanto teve de suportar, as críticas e
os espinhos que tentaram atingi-lo durante a composição da Doutrina Espírita.
Nenhum
deles, porém, desistiu da tarefa que abraçou, por considerá-la mais importante
do que a clareza da percepção quanto à ajuda de Deus. Em outras palavras, era
mais importante continuar a trabalhar, como se fosse o mais sagrado dever que
assumiram, a aguardar mensagens divinas, em fatos insólitos, para confirmar que
estavam no bom caminho.
Até
mesmo Jesus, quando pediu a Deus que O afastasse daquele cálice, foi
interpretado por alguns como tendo um momento de fraqueza, o que é uma opinião,
esta sim, fraca.
Se
os personagens aqui citados tiveram realmente momentos de falta de fé, agora
isso tem pouca importância.
É
mais significativa a observância de seus exemplos, que parecem ter sido a
sustentação da fé que depositara no que fazia.